quarta-feira, abril 26, 2006

Controle Total

- "Pai!!! O que aconteceu com a tela?" - gritava o garoto enquanto manuseava os dedos pelo sensor plasma. - "Não consigo acessar nenhum link!" - repetia deslizando os dedos sobre o sensor, navegando pela página web aberta.

Quando o pai chegou no quarto e percebeu a mensagem na tela, rapidamente correu para a tomada e desligou todo o computador. O site estava travado e uma janela de alerta havia sido aberta com os seguintes dizeres: "Informação não é moeda de troca, é liberdade e direito. Você foi recrutado!" A mensagem por si só já era assustadora, mas o temor maior vinha logo abaixo do texto, em uma imagem pequena e simples, na verdade, uma sigla estilizada. A sigla era NFF.

- "O que é NFF, pai?"
- "Nada meu filho. Você é muito novo para entender esses loucos que vivem por aí. Amanhã vamos comprar uma vacina pra nossa máquina. Até lá acho melhor manter o computador desligado, ok?"

O garoto se chamava Marco Fuentes, tinha 13 anos. Nascido e criado no mundo conectado. Aprendeu a ler bem antes dos outros meninos. Aos 12 anos já havia feito seu primeiro site, algo não muito diferente para sua idade. Mas a questão é que o site que ele desenvolveu tinha uma estrutura de programação sofisticada demais para sua idade. Coisa que alguns bons universitários ainda estavam aprendendo.

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- "Eu entendo, sargento. Mas fico preocupado. Marco é viciado em Rede. Entendo. Sim. Sim. Gostaria que viesse aqui analisar a segurança da máquina. Sério? Então creio que é melhor. O senhor tem o telefone? Ótimo... É de graça mesmo? Só entregar a máquina e apresentar o boletim de ocorrência? Ótimo. Muito obrigado."

O pai vai ao quarto do filho, desliga a máquina e empacota. O garoto estava na aula. Chegaria só à noite. Era o momento ideal, e, pensava o pai, menos doloroso.

Passados alguns minutos após um telefonema feito à MagnaNet Secure Service, a campanhia tocou. Eram dois homens, com uniformes azúis, usando bonés com a logomarca da MagnaNet.

- "Boa tarde. O sr. deve ser o sr. Carlos Fuentes, certo? Pode nos mostrar uma identificação?" - antes que o pai colocasse a identidade de volta no bolso o homem pediu para apanhar a máquina. O pai entregou a caixa. Quando já se despedia deles o outro se aproximou. - "Sr. Fuentes. É exigido pela empresa que façamos uma verificação da linha de conexão da sua casa. O sr. é integrado à Rede..." - "Quatro, cinco e seis." - completou o pai rapidamente. - "Certo. Posso fazer a verificação. Não demoro mais que três minutos. Prometo. É rotina da empresa." - afirmou o homem entrando na casa. - "Claro. Vamos até o quarto dele... Ah.. aqui está o boletim de ocorrência."

Os três subiram a escadaria. Ao entrarem no quarto do menino, o mais alto foi até a saída de conexão na parede. Retirou da maleta um aparelho pequeno e prateado. Desparafusou o conector das redes e começou a mexer. Quando o pai se aproximava para acompanhar, o outro homem o chamou de volta. - "Sr. Carlos. O seu filho tem 12 anos, correto? Ele tem algum comportamento estranho ou costuma ser curioso em relação à Rede? Pergunto isso porque tal tipo de pessoa pode se envolver, inocentemente, em confusões na Rede... Seduzidos pelas ferramentas que existem por aí, muitos garotos com a idade dele perturbaram a ordem na Rede e seus pais tiveram que pagar multas altíssimas."

O pai ficou preocupado. Mas preferiu omitir o fato da genialidade de seu filho ter sido alvo de séria investigação por parte de membros da conceituada A.R.C. e do Departamento de Defesa Digital. - "Acho que não. Ele usa para ter aulas, jogar com os amigos e conversar com outras pessoas." - O homem falou olhando em seus olhos. - "O sr. sabe que pessoas são essas?" - O pai ficou aborrecido e respondeu sério, com voz autoritária. - "Eu não vigio meu filho." -"Pois devia!" - respondeu o homem ironicamente. - Quando o pai se aproximou mais para dar uma resposta à altura, o outro homem se aproximou e informou ter terminado o serviço. Havia trocado os conectores por outros mais atualizados. Ainda, antes de sairem da casa, entregaram um documento para o Sr. Fuentes, informando que devido ao incômodo a MagnaNet daria, como cortesia e pedido de desculpas, dois meses de conexão às redes usadas. Sem custo algum.

A preocupação do pai acabou rapidamente e ele, logo que fechou a porta, ligou para o número do documento e informou a senha. A telefonista informou que sua nova máquina chegaria em um dia útil e que, a partir de seu primeiro acesso, dois meses seriam contados como acesso gratuito. O Sr. Fuentes ficou realmente feliz. Agradeceu e se sentiu satisfeito com a qualidade inquestionável dos serviços da MagnaNet.

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