sexta-feira, junho 22, 2007

BIT - O Primeiro Encontro

Sâo 23h47. Chuva densa, intensa... extensa...

Pago caro pela infâmia e arrogância de meus antepassados. Tenho um encontro esta noite. Mas não é um encontro amoroso, nem vou encontrar um velho amigo para colocarmos a conversa em dia. Meu encontro de hoje é para se marcar na História. Uma das pessoas mais importantes do Ano 2333. Mas, é coerente eu registrar isso, essa pessoa é tida como criminosa e seus crimes são responsáveis por milhares de mortes, por trilhões de prejuízo. Seu nome verdadeiro é misterioso, mas, seu "nome de guerra" é respeitado em todo o planeta, e temido.

Bit. Eis o nome da pessoa cuja mente e sagacidade assustam os mais reacionários e incendeiam os mais revolucionários. Eis que esta noite, neste momento, carregando apenas um revólver e pouca munição, encontrarei Bit, o homem que me deu a honra de ser seu maior perseguidor.

E o lugar de nosso encontro não seria outro senão uma Câmara de Hiperconexão, frequentada, a essa hora da noite, por, no mínimo, 500 pessoas. Eu arriscaria dizer que muitas aqui sabem quem eu sou e ainda não me assassinaram por temerem demais o peso desta ação.

Bit disse que me encontraria aqui. Já são 22h49. Ele disse que não se atrasa. É preciso como um código binário, ironicamente.


- Com licença... É você quem eu procuro. O grande investigador. - apertou-me a mão, de repente, um homem que veio da multidão.

- E devo dizer que você é Bit. Meu arquiinimigo. - disse-lhe apertando a mão com um pouco mais de força.

- Aperta minha mão para provar sua virilidade ou para disfarçar o suor que escorre por entre seus dedos? - ele me disse calmamente, retirando a mão assim que, desconcertado, eu a soltei. - Está armado?

- Sim. Mas estou sozinho. Carrego comigo apenas a lei e algumas centenas de mandados de prisão, do tipo "vivo ou morto". - sorri sarcasticamente encarando-o.

Calmo. Óculos. Cabelo curto, levemente raspado. Barba crescida. Jaqueta de motoqueiro e camisa vermelha. Jeans sujo e maltrapilho. Sapatos quaisquer. Alguns sessenta e poucos anos.

- Venha - ele me chamou - vamos sentar em algum lugar e pedir uma bebida. Tenho revelações a te fazer, antes que me prenda. - Bit saiu e se misturou à multidão. Confesso que o perdi de vista umas duas vezes antes que o encontrasse em uma mesa, no fundo do estabelecimento.

Se ele quisesse ter fugido já o teria feito. Aliás, nem teria marcado esse encontro comigo. É isso que mais me intriga. É isso que me faz não odiá-lo como deveria. É isso que me faz, de certa forma, respeitá-lo mais que muita gente.

Sentei na cadeira vaga. A mesa estava, como era de se esperar nesses lugares, suja de uma maneira irreversível. Uma garçonete se aproximou e pedimos duas cervejas. Ele também pediu alguns amendoins torrados.

- E então, meu caro? Não vim aqui para ter uma típica conversa de bar. Creio que o que tem para me contar é tão precioso quanto sua liberdade, e, claro, sua vida. - sempre fui direto com todos, e, mesmo à frente de um dos mais perigosos criminosos que o mundo já viu, eu não me deixei amolecer.

- Eu sei muito bem dos riscos que corro. Assim como você deve saber dos que corre. Nossa conversa está sendo enviada para meus servidores. Um programa está gravando tudo e posso mostrar ao mundo que você anda com pessoas perigosas. - ele sorriu levemente. - Aliás, sei que você pode apontar uma arma para mim agora e me levar preso, ou até mesmo me matar. Foi pensando nisso que uns amigos estão cuidando de nosso "bem-estar".

- O que? Como? Quem? - eu confesso que me assustei. Coloquei a mão no coldre.

Bit, notoriamente me viu movendo a mão para baixo da mesa. E antes que eu abrisse a boca de novo, ergueu um pequeno espelho que fazia parte da decoração da mesa:

- Veja!

Naquele instante uma gota de suor escorreu por minha testa. E era exatamente em minha testa que o motivo de meu terror corria. Uma pequena, quase imperceptível, ponta de luz vermelha se movimentava pelo meu rosto. Outra fazia o mesmo em meu peito. Eram miras laser. E as armas que as apontavam em mim deviam ter o poder de fogo suficiente para me partir ao meio.

- Você é perspicaz, Inspetor. Eu respeito isso. E é corajoso também. Mas, entenda que não posso correr tamanho risco. Se algo acontecer aqui fora do planejado, toda sua investigação será questionada pelo vídeo, e a sua vida estará em jogo. - ele disse bebendo um gole de cerveja e limpando a barba, umedecida pelo drinque.

- Deveríamos jogar xadrez, um dia. - disse eu recolocando as mãos na mesa. (Não era hora de beber, pois o fato de segurar o copo mostraria o tremor que me invadira).

- Quando quiser, ele respondeu. Mas vamos aos fatos. Sei que anda investigando, paralelamente, coisas que seus superiores poderiam não aprovar.

- E quais coisas seriam essas, Bit?

- MagnaCorp. Eu sei que investiga a MagnaCorp.

- Sim. Mas isso não é tão grande mistério.

- Correto. Mas eu sei onde quer chegar e, eu lhe digo, não irá muito longe através de seus métodos formais e intimidadores.

- É um risco que EU (falei mais fortemente) escolho correr. Você é um criminoso. Não deveria me dar lições de moral ou dicas profissionais, não acha?

- Não!

Eu o olhei diretamente nos olhos e o brilho de seus olhos parecia dizer alguma coisa por conta própria. E o que estes olhos iriam me dizer mudaria profundamente muitas coisas me minha vida.

- Inspetor... Você é um homem respeitado. Você é meu grande adversário. Muitos sonharam em fazer metade do que você fez. E é por isso que eu o procurei, porque, no fundo, sei que você pensa como eu. Eu apenas estou uns passos à sua frente nesta questão.

- Que questão é essa?

- "Por que a MagnaCorp detêm redes fantasmas?" "Por que a ISA faz silêncio sobre os golpes da Magna e da Interway?" "Por que eu me sinto incomodado com isso?" - ele apoiou o queixo em uma das mãos.

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